(...) As linhas grosseiras da parte inferior do rosto. O que mais impressionava, apesar do seu vigor, era a palidez mortal que lhe dava ao mesmo tempo um aspecto de cansaço e um feitio a bem dizer dolorosamente ardente, que não se coadunava com o insolente sorriso rude nem com a expressão dura e presunçosa dos olhos. Agasalhava-o um grosso sobretudo preto forrado de pele de carneiro e que não lhe deixava sentir o frio nocturno.
O Idiota, Dostoiévski
Afirma Pereira, Antonio Tabucchi
Depois de assistir a sete filmes em menos de 48 horas, tenho a estranha sensação que compreendi mais da vida humana nos últimos dois dias que no resto do ano.
Tenho à minha espera uma empreitada grande, que irá ocupar-me muitas noites nos próximos meses e reduzir-me as já escassas pestanas. Talvez a graduação dos meus óculos aumente e tenho a certeza que no final não estarei mais lúcido. Tanto esforço não será para um romance de forte envergadura, nem temos a certeza se teremos uma composição digna desse nome. Se ainda assim, estimado leitor, com tão francas promessas, estiver disposto a ajudar este pobre diabo e tiver indicações sobre o paradeiro da estrutura de ferro do antigo mercado da Praça da Figueira, ficarei eternamente agradecido. Se a vida o abençoou com um avô ou avó de idade avançada cuja lucidez ainda seja um motivo de comemoração diário, será um excelente motivo para uma interacção familiar de grande qualidade e um contributo de peso para o meu problema de imaginação desenfreada. Se for o feliz proprietário de fotografias de Lisboa antiga e não souber o que fazer com elas, envie. Se o problema são as chaves de portas de entrada em locais de grande interesse histórico na cidade e não tiver visitantes e estiver disposto a oferecer uma visita guiada, prometemos ir de gravata e portarmo-nos bem. Lembre-se que é Natal, é uma grande oportunidade de não ser visitado pelos três fantasmas.
Contribuições de grande espírito natalício para umhomemnacidade@gmail.com. Assunto sério.
Logo a abrir, aparece-me pousada sobre o Tejo como uma cidade de navegar. Não me admiro: sempre que me sinto em alturas de abranger o mundo, num pico dum miradouro ou sentado numa nuvem, vejo-te em cidade nave, barca com ruas e jardins por dentro, e até a brisa que corre me sabe a sal.
José Cardoso Pires, Lisboa, Livro de bordo
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES