Um dos textos que li aqui foi o Sem amor, sem abrigo apesar da temática não ser a mais apropriada, pensei que seria pertinente ler o texto mais procurado no blog. Infelizmente, como se adivinha, a maioria das entradas são pessoas à procura de notícias sobre os suicídios ocorridos no próprio dia. A partir desse facto foi inevitável fazer a viagem inversa, procurar eu novas histórias também. O texto originou igualmente alguns emails. Mas a viagem mais complexa aconteceu no próprio evento. Ao jantar alguém questionava-me o motivo de ler um fórum de suicídios. Não tinha uma resposta pronta, e a esta distância só me ocorre dizer que não percebo como não o poderia fazer. Talvez no futuro, quando o puzzle estiver completo, tenha uma resposta mais sapiente, por agora continuo intrigado o suficiente para o continuar a fazer apenas. A mesma pessoa curiosa pelos minhas leituras mórbidas tinha uma história para oferecer. Era a segunda pessoa a quem a contava. Um dia ao ir para o trabalho passou por uma ponte. Na ponte estava um homem sentado. O instinto alertou-o para a situação e decidiu parar o carro e abordar a pessoa. O pior aconteceu, o homem saltou. Há um medo em nós quando pressentimos que o relato não vai acabar bem, mas como não o ouvir? Mas a situação mais dramática aconteceu no dia seguinte depois da minha intervenção. Uma pessoa leitora do blog que compareceu ao evento, contou-me no jardim, por entre caipirinhas e planos de férias, que o filho tinha cometido suicidio. Não consigo descrever o momento. Faltam-me palavras, falta-me estrutura para alinhavar palavra atrás de palavra para descrever o que senti. Talvez alívio, por nunca ter passado por uma perda dessas. Como ultrapassar algo assim? Estranha viagem a de alguns textos, na memória perduram recordações alheias – o som que o corpo fez ao cair, o braço que ficou esfacelado na estrutura da ponte a tentar segurar o inevitável, o cinto que cedeu ao peso – e desejos de homenagem – será tempo de publicar os desenhos que ele era perfeito a fazer?
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES