Mal colocamos um pé na ilha somos abordados pela diversidade da vida animal. Começamos nas baratas gordas com dez centímetros que tropeçamos amiúde. Na praia os lagartos cruzam os nossos pés. Há cães e gatos por todo o lado, nunca os tinha visto tão amistosos. Contam-me, na noite em que chego, que um estranho fenómeno sem explicação acontece com frequência – ninhadas de gatos paraplégicos. Há tartarugas gigantes no mar e atuns de quatro metros a serem esquartejados no pontão. Na água há golfinhos, baleias e peixes roxos. Na paisagem as garças recortam a paisagem. Esvoaçam uns estranhos passarinhos, aparentados de pardais, a saltitarem por todo o lado. Toda a viagem é composta pela demanda do momento em que olvidamos tudo. Se não fosse essa procura não teríamos muitos motivos para andar pela terra. Esse momento aconteceu hoje. Por uns longos segundos, esqueci-me do ontem, do hoje e do amanhã, no momento exacto em que dentro de água avistei o corpo de um tubarão de dois metros demasiado perto para a minha segurança física. Bastou-me ver o dorso e fazer uma medição rápida da distância entre uma barbatana e outra para ter uma ideia aproximada do porte do animal. De uma assentada tive o meu momento e compreendi o coelho encadeado pelos faróis na estrada.
a minha língua é a pátria portuguesa
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grandes crimes sem consequência
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LEITURAS
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