Ao jantar.
Homem 1 – Mas, então não concordas que certos actos devem ser punidos?
Homem 2 – Desagrada-me a ideia de vingança. Quando retalias da mesma forma tornas-te igual a eles.
Homem 1 – Mas a vingança também pode ser uma forma de justiça. Poderá ser uma forma de evitar que o mesmo crime aconteça outra vez.
Homem 2 – Prefiro acreditar que não há nada que não tenha o seu castigo merecido, mais cedo ou mais tarde.
Homem 1 – Mas deus não existe. E se no fim houvesse sempre um castigo, não estaríamos a ter esta conversa. Este diálogo prova que a maior parte das vezes não há castigo nenhum. Esse é que é o problema.
Homem 2 – Mas existe a tua consciência. A vingança nunca é solução.
Homem 1 – Sendo assim, estás à mercê de qualquer pessoa ou situação. Se alguém prejudicar ou insultar não será punido. Se isto acontecer a ti, e se não for um caso de polícia ou tribunal, a tua única resposta será não responder?
Homem 2 – Depende do caso...
Homem 1 – Se fores insultado publicamente, sem razão nenhuma, por exemplo? Não dirás nada?
Homem 2 – Já aconteceu. E reagi, mas não considero isso uma vingança.
Homem 1 – Se reagiste estás a dar-me razão. Embora eu não dê a mesma conotação negativa à palavra vingança. A vingança poderá servir para aplicar a justiça nalguns casos. Será a forma de reacção que define a justeza de resposta.
Homem 2 – Naquele caso acho justo ter enviado os homens.
Homem 1 – Os homens?
Homem 2 – Sim. Angolanos.
Homem 1 – ... ?
Homem 2 – São bastante eficazes e discretos. Nunca mais tive chatices. Se tiveres algum problema dou-te o número.
Homem 1 – Mas eu não acredito na violência.
Homem 2 – Olha que às vezes uma coça resolve muita coisa. É limpinho. Tens é de contratar os gajos certos.
Homem 1 – ...
a minha língua é a pátria portuguesa
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LEITURAS
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Caixa para pensar – Manuel Carmo
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