Na rua sigo ao mesmo ritmo que dois homens que conversam sobre os seus amores e o o desejo das mulheres. Os tempos estão diferentes, diz um ao outro, o que elas querem agora são homens mais velhos, são os que têm dinheiro. Estará um a consolar o outro, talvez a introduzir a economia no tema difícil do amor, será contabilista, pergunto-me enquanto os observo melhor e verifico que já não são novos e nem têm ar de muitas posses. Decido-me pela consolação, talvez uma mulher tenha ido embora, já não faça parte da vida do homem. Se há coisa que necessita de explicação são as ausências dolorosas. No cruzamento seguinte paro na máquina do multibanco. Sentados na arcada ao lado, outros dois amigos de idade avançada. Um descreve ao outro uma mulher; sabe cozinhar que é uma maravilha, percebe da lida da casa, passar a ferro e outras coisas que tais. Explica com detalhe uma receita dela, um petisco refinado aos seus olhos, não há quem faça igual. Afino o ouvido, é uma vergonha, bem sei, isso de escutar as conversas dos outros, mas não resisto a homens a discutir o amor, acepipes e lençóis, perdidos no poço da sua geração.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
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Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES