Quinta-feira, 16 de Dezembro de 2010

 

A mesma expressão encontrava-se, de resto, para onde quer que se olhasse, no rosto dos restantes espectadores. Porém, quando o fulgor da última sequência de imagens se dissipou de rompante, as luzes se acenderam na sala e o campo das visões se transformou numa tela vazia diante dos olhos da multidão, nem palmas eles puderam bater. Ninguém estava lá para receber a ovação, ninguém que se pudesse chamar ao palco para agradecer a mestria da representação. Os actores, que ali havia contracenado para fruição da assistência, há muito que estavam dispersos pelos sete ventos. O que ali se vira era tão-só sombras da sua produção, milhões de imagens fixadas instantaneamente, segmentos de acções que se restituíam depois do tempo, num ritmo alucinante, da forma como queríamos e as vezes que quiséssemos. O silêncio que a multidão mergulhara após a ilusão tinha qualquer coisa de letárgico e repulsivo. As mãos esquecidas no colo, impotentes, estavam diante do nada. As pessoas esfregavam os olhos, olhavam fixamente para a tela, envergonhavam-se de tanta luz e desejavam regressar à escuridão, na esperança de voltarem a ver, na esperança de depararem com coisas que, embora não pertencendo ao passado, eram transplantadas para o presente e retocadas pela música.

A Montanha Mágica, Thomas Mann



publicado por afonso ferreira às 01:27 | link do post | comentar

mais sobre mim
Dezembro 2012
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1

2
3
4
5
6
7
8

9
13
14
15

16
17
18
19
20
21
22

23
24
25
26
27
28
29

30
31


posts recentes

the end

Sleepless people

provérbio transmontano

cry me a river

Falta de rigor

obrigado

prémios literários

meia-noite

battle

status

Día domingo

imaginação

virtudes públicas, vícios...

fios

Estudos de um processo

arquivos

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

tags

a minha língua é a pátria portuguesa

cartas

casamento gay

coisas extraordinárias do gabinete

conversas de caserna

correspondência epistolar

corrupção

dias felizes

domingo

domingos

estudos

ghost writer

gira-discos

grandes crimes sem consequência

literatura

mercados

mundo virtual

outras cidades

paixonite

pequenas ficções sem consequência

perdido no arquivo

playlist

relvasgate

sonhos

suicídio público

taxistas

telenovela

um homem na megalópole

vendeta

viagens

todas as tags

links
subscrever feeds