Um blog pode deixar muitas pessoas nervosas. Principalmente os blogs anónimos, o que não é o caso deste. Obviamente que o facto de estar assinado não quer dizer que essa seja a verdadeira identidade do bloguer (v. caso abrantes) mas se não for utilizado para encobrir cobardias, ataques vis ou incitar à invasão da Polónia, não vejo qual é o problema. Os limites da privacidade de cada um só podem ser estabelecidos pelo próprio. Quem me conhece pessoalmente sabe que este blog pertence-me e isso chega-me. Foi criado inicialmente a propósito da publicação dos textos de ficção embora por vezes também comente aspectos da minha vida quotidiana e política. As minhas posições são explícitas nos post que tenho publicado. Tenho costas largas, assumo sem reservas o que escrevo. As tentativas para expor a minha "identidade" são acolhidas como o resto na minha vida: com um encolher de ombros e humor (negro). Uma coisa é certa, não estou disponível para participar em jogos de poder nem o blog servirá para puxar o lustro à minha pessoa, sempre detestei marionetas de pacotilha não darei o prazer a ninguém de ser mais uma.
(...) Maria Eugénia torse o nariz, diz que "preferia Sesimbra".
Revista Única, Jornal Expresso, 27 de Fevereiro
Uma excelente ideia: troca-livros.blogspot.com.
É interessante observar as coisas com distância e constatar que algo que pensávamos ser um azar pode ser afinal uma sorte descomunal. Acontece raramente, é como andar com o bilhete de lotaria premiado no bolso sem saber.
Numa ronda pelos blogs fico contente por optar não entrar em confrontos pindéricos, nem resolver a minha vida amorosa ou ódios caninos na internet num despudor embaraçoso. Prefiro ser a caravana, não os cães que ladram na berma da estrada.
Todos os sms e emails de amor são ridículos. Não há sentimento esdrúxulo que os salve.
Percorro as ruas em passo de corrida. Atrasado, atravesso a baixa ao anoitecer, pessoas, semáforos, verde-vermelho, carros e vida frenética. Viro no elevador de Santa Justa, ao chegar ao edifício identifico-me, deixo uma fila para trás e subo sozinho no elevador. No topo do edifício há uma festa, mais pessoas do que imaginava, um ar de expectativa enche-me os pulmões. Penso que afinal devia ter convidado alguém mas é tarde de demais. Dirijo-me ao bar e o empregado sem hesitar serve-me uma bebida sem perguntar nada. Devo estar com cara de quem precisa de algo forte. A bebida escorrega e incendeia-me as entranhas. Sabe bem, estava a precisar disto. Não tenho tempo para pensar na solidão, as pessoas sucedem-se, conversas entrecruzadas, reencontros. Passamos ao auditório, sento-me e deixo de pensar no caos do mundo. As cantoras entram em palco, o concerto começa, e eu penso, por um instante, que afinal é tudo tão simples. Se pudesse ficava aqui para sempre. Nos camarins sinto que percebo tudo, estou aqui e não poderia estar em mais lado nenhum.
"Édipo é a verdadeira Felícia Cabrita de si próprio.
Toda a gente lhe diz que não investigue, e ele continua a investigar"
Jorge Silva Melo, Y, 19 de Fevereiro
Fui ver e gostei. Um filme sobre a morte, o desespero, o amor e a redenção. Com cenários fabulosos (e um Mercedes incrível...). Há diálogos a raiar o sublime. Quem já viveu uma situação parecida, a perda de alguém fundamental na sua vida, percebe a essência do filme.
Na esquadra à conversa com o polícia.
Polícia - A sua fotografia da carta de condução está radicalmente diferente da do cartão de cidadão.
Eu - É o penteado. A fotografia já tem alguns anos.
Polícia - Não é só isso, o rosto também. Só os olhos estão iguais.
Eu - É grave?
Polícia - Não se preocupe não o vou multar.
Eu - Por causa do meu aspecto ou porque não tenho a morada igual nos dois documentos?
Próximo Futuro, 2º workshop de investigação As Cidades. Amanhã, 25 de Fevereiro na Fundação Calouste Gulbenkian.
Depois de regressar de viagem estranhei a falta de algo precioso na minha vida: o meu carro. Hoje conheci uma esquadra da polícia nova. Já faltam poucas para acabar a caderneta. Depois de dezoito chuis (sim, 18, eu contei), três horas e meia e dois parques de reboque, consegui recuperar o dito. Que por incrível que pareça estava há quatro dias na garagem de um prédio de um bairro social que eu nem sabia que existia.
Os buracos da cidade têm pouca estrada
Frase de um taxista hoje a assapar numa rua esburacada de Lisboa comigo a chocalhar no banco de trás.
I.
Divido o manuscrito em dois como quem corta um baralho de cartas. Ato cada parte a um dos pés com cordel grosso, verifico se está bem preso. Abro as válvulas do coração para o sangue estagnado na barragem correr livremente. Caminho pela marginal da vila paralela à ria. Espera-se a tempestade, os barcos e as gaivotas estão em terra, mas eu estou preparado. Passo pelo pontão solitário, os pescadores estão na casa das embarcações a jogar à sueca. Nem pestanejam à minha passagem, esta vila está habituada a coisas mais estranhas. Ouço falar da ilha abandonada a 4 km da costa mas aqui nunca é possível distinguir a verdade da ilusão.
II.
E porque estou eu aqui? A história começa há uns anos atrás quando o meu amigo chegou à vila numa noite de calor tórrido. Ao chegar à marginal viu um espectáculo insólito. A rivalidade entre os habitantes e os de uma vila vizinha tinha atingido o auge. Poderia ter sido o Romeu e Julieta mas como a vida real supera sempre a ficção, não havia amor, só ódio. Um dia a julieta da vila entrou no barco para atravessar a ria e o romeu de serviço atirou umas palavras despropositadas. A julieta não achou piada à falta de dotes falantes do romeu da vila rival. Chegando a terra tratou de tocar o sino a rebalde e convocar os capuleto em peso. Que não só partilharam da indignação como resolveram tirar o assunto a limpo com gasolina e fósforos. Quando o meu amigo chegou o que viu foi o pontão e a casa das embarcações a arder e a vila inteira satisfeita a ver. No dia seguinte o pacto de silêncio percorreu a vila e ele decidiu que era terra para ele.
Esta é uma história sem fim e esta noite teve mais um capítulo. Numa mera corrida de dez minutos, entre a baixa e o Saldanha, o taxista conseguiu falar da guerra, de Delacroix, explicar a teoria dos pensamentos profundos que se diluem no ar e ainda contar a história do colibri como metáfora para acabar com a fome no mundo.
Caritas
Conta nº 1626371377
NIB nº 0038 000116263713771 13 do Banif
Conta Banif Solidariedade com as vítimas da Madeira
NIB: 0038 0040 50070070771 11
I.
Na rua escura e deserta, noite ainda cedo, sou abordado por quatro adolescentes tão imberbes como eu. A pretexto de um cigarro sou encurralado. No momento em que se aproximam deduzo o perigo, fazem perguntas agressivas, tentam baralhar-me, se tiver medo facilito-lhes a vida. Ofereço cigarros, respondo a tudo, dou-me ao luxo de acender um também e discretamente olhar para os dois que posicionaram-se nas minhas costas. Até faço perguntas. Quando o momento está tão tenso que não há mais nada a esperar do que o desfecho natural, perdido por cem, perdido por mil, atiro-me ao chefe, o que me parece o mais duro, o que decide. Atiro-lhe que o conheço, partilhamos a mesma escola, temos amigos em comum, frequentamos o mesmo campo de jogos. Olho de frente, sem hesitações, com o coração nas mãos, mas quem vê caras não vê corações e naquele momento tenho dois tipos de mãos nos bolsos a centímetros dos meus rins e de algo muito trágico. O chefe fica imóvel, faz contas à vida, diz que não me conhece, que estou a fazer confusão. Eu insisto, tenho a certeza que é ele. Nunca na minha vida o vi. Movimentos imperceptíveis dizem que está na altura de largarem-me. Desaparecem tão rápido como surgiram e eu fico sozinho na noite escura a pensar que se alguma coisa me há-de safar na vida é o raciocínio rápido. Pelo menos de levar uma facada.
II.
No restaurante de luxo com a cidade aos nossos pés, ouço-o enquanto levo o copo aos lábios para ganhar tempo. Está a conduzir a conversa, sabe bem onde quer chegar. Eu também sei qual é o desfecho mas acendo um cigarro, preciso de raciocinar. Faço perguntas, vou respondendo a algumas não dizendo nada. Quando estamos a atingir a velocidade cruzeiro, dá a entender que tenho de escolher um lado, que as minhas acções não passam despercebidas. É como se recuasse vinte anos e tivesse outra vez os dois tipos atrás de mim. Bebo vinho, sorrio, penso que em vez de uma pasta com livros escolares agora tenho bolsos cheios de lutas, assaltos no ringue. Penso que depois dos quatro rufias já tive armas apontadas à cabeça mas nunca tive tanto medo como na primeira vez. Penso que aprendi muito entretanto e, acima de tudo, que os ratos são iguais em todo o lado. Atiro-me a ele, digo-lhe nomes que sei que fazem efeito, dou a entender que o conheço muito melhor do que julga, que sei coisas que ele não sabe. Que passeio no mesmo campo de jogos. Substitui o sorriso na cara por umas rugas de expressão que não estavam no sítio antes. Bebe para ganhar tempo e acaba a recuar. Safo-me a um assalto com a mesma técnica recitada na rua duas décadas antes. Os cobardes são sempre iguais.
Ao ler os jornais penso que deve ser verdade que deus está nos pequenos pormenores porque nas grandes questões não o encontro.
Marcos Perestrello – O teu superior hierárquico [Rui Pedro Soares] foi para Barcelona ou Milão...
Paulo Penedos – Não, está no Algarve. Não foi para um sítio, nem para outro.
MP – Mas depois vai, acho eu.
PP – Vai para Milão, segunda-feira. Vai-se lá encontrar com o Figo, para com ele celebrar uma coisa um bocado pornográfica, mas pronto.
MP – Que é o quê?
PP – Eh pá … só te posso dizer se tu não disseres a ninguém. Se disseres, não te posso dizer.
MP – Se quiseres dizer, dizes! Se disseres que não é para dizer a ninguém eu não digo.
PP – Não, não digas que é uma coisa… Ele há dias disse-me, muito contente, que tinha conseguido que o Figo apoiasse o Sócrates e eu disse ‘boa e tal’, claro que é importante. E hoje ligou-me a pedir que eu lhe fizesse um contrato de patrocínio para a Fundação Luís Figo, à razão de 250 mil euros por ano.
MP – Pois, imagino…
PP – Ah?
MP – Claro, claro. E isso, aliás, vale muitos votos! Essa merda em subsídios de desemprego…
PP – Ah?
MP – Isso em subsídios de desemprego…
PP – Eh pá, mas ouve-me… O gajo conhece toda a gente e mais alguma e toda a gente em que ele tropeça, do mundo da bola, de repente estão a apoiar o PS e o Sócrates, mas depois todos têm por detrás contratos… todos têm contratos… Até deve ser alvo de alguma risota, não é.
MP – Por acaso não me deram o nome do Figo para os tempos de antena das personalidades para depor!
PP – Pronto, faz-te de novas que o nome vai-te aparecer, só que o apoiante espontâneo e fervoroso primeiro deve querer assinar o contrato, não é?
MP – Sim, sim, vamos ver se depois aparece, se é como outros que eu cá sei que acham que é melhor não darem a cara. Acham que é melhor não darem a cara, abrem uma coisa ali, outra ali.
PP – Exactamente …
MP – Ai..., não aprenderam nada ainda.
O Sol revela as conversas mantidas entre Marcos Perestrello, membro do Secretariado do PS e actual secretário de Estado da Defesa, e Paulo Penedos, membro da Comissão Nacional do PS e advogado na PT, exercendo funções na dependência do administrador executivo Rui Pedro Soares, sobre o apoio de Luís Figo à candidatura de José Sócrates aqui.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES