Segunda-feira, 1 de Fevereiro de 2010

 

Old fashion, diz ele. Levou uns piropos no sábado à noite na pista de dança e consequentemente um apertão no pescoço do mais-que-tudo da atrevida. Agora diz que vai cantar, influências do Chet Baker. Encontrou (encontraram-no) no Facebook pessoas com as quais já não trocava palavras há vinte anos. Os gajos de há duas décadas atrás quando o pai morreu, todos juntos por causa da morte do Eduardo que deixou uma filha bebé. Eu, que não conheci o Eduardo, mas que mortos é o que não falta na minha vida, percebo a sua consternação a propósito da voracidade do tempo a passar. É estranho ter memórias com vinte anos, diz na esplanada encavalitada nos telhados de Alfama num dia de tréguas. Lembra-se do candeeiro que teve de apresentar. O pai morto e ele a explicar que não tinha interruptor, tocava-se no objecto e fazia-se luz. A explicar mecanismos inovadores com o mecanismo interior feito em papas. Afinal de que morreu Chet Baker? E onde anda o candeeiro? Isto é bonito. Um museu a céu aberto é o que é. As casas, o empedrado das ruas, as buganvílias, a agência funerária, o palacete com a velhinha. Vamos tocar à porta?, diz e eu, por pouco, não espeto o dedo na campainha. Na pista de dança a amiga frenética mantinha-se abstémia. "Eu sou concentrada, é só juntar água" diz ela e ele achou piada. Há um mundo novo nas pistas de dança, já tinha ouvido falar, mas não sabia que existia, diz ele. 



publicado por afonso ferreira às 15:24 | link do post | comentar

Somos infalíveis na nossa escolha de amantes, particularmente quando precisamos da pessoa errada. Existe um instinto, uma força magnética ou antena que busca o inadequado.

Hanif Kureishi



publicado por afonso ferreira às 12:24 | link do post | comentar

 

Todos os dias fossem assim e encontrasse um post destes



publicado por afonso ferreira às 11:49 | link do post | comentar

 

 



publicado por afonso ferreira às 02:37 | link do post | comentar

 

Serpenteio pelas ruas, o motor a roncar por cima dos trilhos dos eléctricos, o céu pardo, o cigarro na mão para pensar melhor. Dou duas voltas ao Panteão, passo no largo, hoje tão despido sem a feira da ladra. O mercado de Stª. Clara fechado. Um centro comercial a anunciar saldos, que juro que nunca antes vi. Falta aqui o bulício, falta gente, falta semana. Sempre me apeteceu vomitar aos domingos só por tédio. Por associação de ideias lembro-me que nunca vi um circo de pulgas e tenho pena. Imagino as pulgas no trapézio, aos saltos no trampolim, a saltar arcos em chamas. Sempre deve ser mais animado que o Panteão, solitário com a cúpula em obras, andaimes que parecem uma teia de aranha à cata de turistas voadores. Esta cidade adormecida. Decido estacionar no sítio mais inclinado que encontrei e seguir a pé. Passo na piscina, aquela em que prometi tantas e tantas vezes nadar contigo e nunca cumpri. Agora apetecia-me mergulhar, recuperar o tempo perdido, o último Verão. Se pudesse mergulhava de botas e sobretudo ignorando o termómetro emocional que está estragado. Olho para o rio e o casario e viro para o cotovelo à procura do prédio de azulejos castanhos. Nesta rua faltam uma dezena de números. Passa do número 20 para o 30 e tal sem explicação. Faltam seis prédios e quem lá vivia e ninguém deu por isso. Uma noite a rua estava completa, estavam os prédios e as pessoas a passar a ferro e a discutir, no dia seguinte eclipsaram-se. Ninguém pestanejou e a vida continuou. Indaguei dos prédios a um homem bonito que mora na rua do eclipse. Primeiro olhou para mim com desconfiança mas percebendo a falha ficou sem explicação, hipnotizado a olhar para a rua. Aposto que estão todos no circo de pulgas a desenvolver truques de ilusionismo. Subo os azulejos castanhos e troco juras de trabalho eterno, fujo ao anoitecer, procuro o carro, a rua está mais meio metro inclinada, mais um pouco o carro capotava e era uma trabalheira apanhar o animal umas colinas abaixo. A piscina continua a olhar para mim, maldito tanque de lágrimas.



publicado por afonso ferreira às 01:11 | link do post | comentar | ver comentários (2)

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