Deus cria as pessoas; o diabo junta.
Já vi a casa assaltada, o carro vezes sem conta, a conta de email idem, o coração também não escapou; mas palavras e expressões é a primeira vez. Bem-haja a falta de imaginação.
Mais de 500 obras literárias estão disponíveis para download gratuito no portal Universia Brasil. Ao todo foram publicados 521 arquivos em formato PDF, que pode ser lido em computadores, tablets e e-readers. As obras são dos mais variados estilos: há desde biografias de cineastas até textos científicos sobre comunicação, passando, claro, por grandes clássicos da literatura.
Nova temporada de insónias agressivas. A noite passada vimos o dia nascer e conseguimos acordar ainda a uma hora matinal decente, o que me obriga a evitar contabilizar o tempo. Digamos apenas que as horas passadas a dormir cabem todas numa mão e sobram dedos. Amigos aconselham mezinhas caseiras e outras de laboratório, mas tenho uma relutância desde sempre aos fármacos. Nunca vi ninguém tomar drogas legais que transpirasse saúde (das outras, as ilegais, vejo muita gente contente e aos pulos) e penso que isso traduz tudo. Uma das coisas que mais resistência sinto é aos supermercados de produtos naturais e afins. Não pelos produtos que são vendidos, mas por quem os adquire. Uma ida às compras ao Celeiro na baixa, o mais antigo e um resistente à voracidade das modas new wave, é uma viagem aos infernos das doenças humanas. Nos corredores passeiam pessoas amareladas quando não são verdes, de cabelos ralos, a tropeçar em olheiras e a arrastar os pés. E não, não é como num hospital, ou pelo menos como nas urgências, onde há emoção, sangue e drama. Ali já estamos na fase do internamento mas por erro clínico. Entramos no supermercado e apanhamos as doenças às compras – a icterícia no auge, o cancro que alastra, o fígado desfeito, a dieta mal amanhada, a depressão crónica; todas a comprar extracto de alho para o sistema imunitário e curcumina para as articulações. Por isso, quando amigos bem intencionados recomendam remédios que não falham eu já sei que recomendam o inferno, e o inferno tem cestinhos de mão onde cabem muito remédios e corredores que cheiram a milho tufado. Hei-de aqui voltar mas agora vou abraçar a almofada a ver se prego uma rasteira às insónias.
Mais vale um amor na mão, que dois a voar.
E eis o momento em que passado cinco dias do acidente percebo que tenho um olho a ficar negro. Amanhã a pergunta que mais devo ouvir é se está tudo bem lá por casa.
O amor nos condena:
demoras
mesmo quando chegas antes.
Porque não é no tempo que eu te espero.
Mia Couto, in 'idades cidades divindades'
Combinei no Nicola por ser um dos meus cafés preferidos. Resistiu ao tempo e mantém a dignidade. Parece-me apropriado. Estou na mesa do costume, duas à direita do
BARBOSA DV BOCAGE 1765 - 1805
à espera com um café à frente do nariz. A caminho do Nicola vi o homem-elefante que agora já tem dois olhos, nariz e boca, mas continua sentado no mesmo degrau. O velhinho que apregoava o apocalipse foi substituído por uma carrinha ambulante com morangos. Deus foi trocado por fruta; o megafone por uma rapariga bonita de avental. Passam dez minutos da hora combinada, o céu está de chumbo. Terei chapéu-de-chuva? Não, ficou em casa para não se estragar. Talvez chegues a escorrer chuva se isto não ficar de feição. O Bocage faz-me companhia enquanto espero. Compreendemos bem as contas um do outro, também teve o Pina Manique a chatear, para além da inquisição, e um ano e meio preso nos calabouços, e nem assim deixou de fazer manguitos ao mundo e contar piadas aqui, aqui onde estou agora a olhar pela janela com o café a arrefecer. E o que chove? Parece noite. Peço outro café para abreviar a espera e viro novamente a ampulheta.
Ter sempre razão pode provir de duas fontes – ser louco e simultaneamente a mais persuasiva das pessoas ao afirmar tal; ou ser a expressão final de um laborioso trabalho. Provar o que se advoga é uma trabalheira – não basta acusar; é preciso observar com atenção o caso, estudar em profundidade o assunto, arranjar provas inequívocas muitas vezes em condições adversas, ser paciente, prever lances muito antes da jogada, e, acima de tudo, ser mais inteligente que os restantes. Mesmo assim, no final nada garante que o julgamento seja ganho, e disso reza a história extensa da minha família, tudo gente do direito, mas sente-se uma grande satisfação poder afirmar no final – tenho toda a razão comigo.
"– Para ela, as palavras resumem-se a meros sons, desprovidas de qualquer sentido ou responsabilidade”; conclusão minha (mais a pensar nas possibilidades formais da coisa do que na sua dimensão moral ou psicológica): “– Essa gaja é uma artista!". Aqui.
Hoje acordei com a chuva, e não sei se por isso ou não, lembrei-me que à quinta-feira de manhã é quando se regista a maior afluência de pessoas na internet (leia-se redes sociais e blogs). Não sei bem o que fazer com esta informação, mas se é quinta-feira recordo este facto. Há dias conversava com um amigo e disse-lhe que pressentia ter comportamentos diferentes consoante a rede onde navegasse e que também não tinha grande justificação para isso, por não depender do meu bom ou mau humor na altura mas da própria rede em si. Foi peremptório a explicar que dependia tudo do tamanho da imagem do avatar, quanto mais pequena a imagem menos identificação temos com o outro, o que justificava o meu quase desprezo pelo Twitter. Também não sei o que fazer com isto, só sei que é quinta-feira e hoje, especificamente hoje, que por acaso é quinta-feira, é um dia muito importante para mim e esta manhã, esta manhã específica, não deveria estar na internet nem a pensar sobre estas coisas.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES