I. Olhar para o desejo à semelhança de uma imagem projectada no ar. Doer uma omoplata e o espaço entre o pescoço e o coração. Não dormir e sonhar acordado. Estender o tempo em círculos nocturnos perfeitos. Despedidas em ruas sujas de restos febris e olhares espantados. Cair da cama abaixo. Espalhar moedas e isqueiros nos interstícios das palavras. Dar cabo do estômago com cafeína.
II. Os dias alongam-se e há horas impossíveis para tudo. Tu tens é sono, sussurra o escaravelho que assentou arraiais na minha escrivaninha. Agora não me doí nada. Talvez uma impertinência aqui ou acolá, nada de monta. Há algo de asséptico em ser bem sucedido. Substituir sangue e lágrimas por suor e saliva, coisas sem valor por pedraria valiosa. As imagens continuam a chegar – escadas rolantes paradas, ondas, instantes mais ou menos felizes, loucuras, mazelas, pontas por atar, pequenos nadas de uma comunhão.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES