Terça-feira, 8 de Maio de 2012

 

 

 

 

Nova temporada de insónias agressivas. A noite passada vimos o dia nascer e conseguimos acordar ainda a uma hora matinal decente, o que me obriga a evitar contabilizar o tempo. Digamos apenas que as horas passadas a dormir cabem todas numa mão e sobram dedos. Amigos aconselham mezinhas caseiras e outras de laboratório, mas tenho uma relutância desde sempre aos fármacos. Nunca vi ninguém tomar drogas legais que transpirasse saúde (das outras, as ilegais, vejo muita gente contente e aos pulos) e penso que isso traduz tudo. Uma das coisas que mais resistência sinto é aos supermercados de produtos naturais e afins. Não pelos produtos que são vendidos, mas por quem os adquire. Uma ida às compras ao Celeiro na baixa, o mais antigo e um resistente à voracidade das modas new wave, é uma viagem aos infernos das doenças humanas. Nos corredores passeiam pessoas amareladas quando não são verdes, de cabelos ralos, a tropeçar em olheiras e a arrastar os pés. E não, não é como num hospital, ou pelo menos como nas urgências, onde há emoção, sangue e drama. Ali já estamos na fase do internamento mas por erro clínico. Entramos no supermercado e apanhamos as doenças às compras – a icterícia no auge, o cancro que alastra, o fígado desfeito, a dieta mal amanhada, a depressão crónica; todas a comprar extracto de alho para o sistema imunitário e curcumina para as articulações. Por isso, quando amigos bem intencionados recomendam remédios que não falham eu já sei que recomendam o inferno, e o inferno tem cestinhos de mão onde cabem muito remédios e corredores que cheiram a milho tufado. Hei-de aqui voltar mas agora vou abraçar a almofada a ver se prego uma rasteira às insónias.



publicado por afonso ferreira às 02:51 | link do post | comentar

6 comentários:
De João Pedro Lopes a 8 de Maio de 2012 às 04:20
na urgência é toda outra alegria da insónia, confirmo ;)


De afonso ferreira a 8 de Maio de 2012 às 11:08
é a primeira vez que um texto meu é autenticado por um médico. vou comemorar o facto de não sido para autenticar a minha insanidade :)


De Fátima Soares a 8 de Maio de 2012 às 11:00
Bom dia espero que tivesse conseguido dar uma "abada" nas insónias! Adorei simplesmente toda a descrição do Inferno(celeiro) porque me vi lá nos corredores a vê-los todos a desfilar. Onde morava ao "pé da minha mãe" existia um também onde coabitavam as "drogas" e chás medicinais com o frango assado, os legumes e refrigerantes e mais uns chocolatinhos "heavy" no piso de baixo...Tal não era a incongruência. Fazia-me lembrar a canção: "Eu tenho 2 amores" Tipo empanturras-te cá em baixo e compras o laxante lá em cima...Ou qualquer coisa dentro do género, que induza o vómito para aliviar a consciência. Estupendo o seu post... Pois! esqueci-me de dizer que ficava e fica no Calvário (o que será a caminho do Inferno) quiçá...E hoje é pertença de chineses, que não mantêm o estilo do frango...Mas uns tuberculos e sojas, mais chás e os legumes c/ as carnes duvidosas...Com os respectivos olhos "amendoados" na caixa. Desculpe o extenso do comentário. Um bom resto de seamna.


De afonso ferreira a 8 de Maio de 2012 às 11:09
Tem piada, eu penso que recordo esse Celeiro. se não estou em erro era do lado oposto ao da polícia no largo, certo?


De Fátima Soares a 8 de Maio de 2012 às 13:09
Exactamente! Lá está no mesmo sítio descaracterizado ) não o sítio rua em si que continua quase igual, mas o local... Sinto-o (me) a mais ali. E penso que não seria eu que deveria sentir-me a mais, mas sim o "insultuoso" que se tornou para mim olhar... Recordar ainda que nessa altura (do frango) já me fizesse sorrir do oposto dos componentes. Hoje não me faz sorrir. Causa-me arrepios, pela impotência. Pela servidão. Sinto-me também eu invadida e não só o "meu" país! Um beijinho


De teresa a 8 de Maio de 2012 às 23:28
adoro as insónias. consigo trabalhar mais, muito mais, e melhor. e evitam pesadelos. e oferecem-nos pequenos pedaços magníficos de texto como este.

abençoadas insónias as suas, afonso.
obrigada.


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