Domingo, 27 de Maio de 2012


Ainda é tão cedo mas recebo imediatamente resposta à minha mensagem. A disponibilidade dos outros, a tua disponibilidade, que me comove, essa forma de velar pela teia complexa que nos une. O dia, luminosidade e vento, mar ao longe. Percorrer a marginal, multidões à beira-mar, quilómetros de corpos em marcha. Subir à serra e o tempo a arrefecer. Frases, conversas, rosários desfiados. Rir do mundo, das coisas excelentes e também das cobardias, rir muito e rir ainda mais um pouco, a franzir os olhos ao sol, o estômago à beira da boca. Almoçar e despachar duas garrafas sem dar por isso, o mar aos pés e planos em marcha. Mapas de sobrevivência e histórias más também, para relembrar prioridades e sentidos. Areia e livros, o corpo a escaldar, e no regresso a marginal a deslizar ao sabor do fim de dia indolente, tudo no sítio respectivo outra vez, a música em volume alto no carro, eu a tentar distinguir a letra em espanhol, a voz da Carminho, e depois aquilo. Um sinal vermelho, dois carros, o estrondo à nossa frente. Chapas e vidros e alguém desesperado, alguém em ruínas, pessoas a correrem, os sinais verde-vermelho-verde-vermelho-verde-vermelho-verde. Aquilo no fim do dia, este dia tão perfeito, um murro, uma violência, uma coisa assim a correr tão mal. Como se os acidentes fizessem parte da geografia dos nossos sentimentos, como se estivessem gravados na pele, a fatalidade sempre à nossa espera entre desencontros, regressos e alcatrão. 


publicado por afonso ferreira às 20:49 | link do post | comentar

4 comentários:
De isabel a 27 de Maio de 2012 às 21:19
a geografia dos sentires , em metal diluídos...
gosto de o ler....


De Inês Henriques a 27 de Maio de 2012 às 21:24
está muito bem escrito :)


De Fátima Soares a 27 de Maio de 2012 às 21:47
Bonita a descrição de sentimentos, sensações e momentos imperdíveis e inesquecíveis. Depois o acordar do sonho ( em que parece ficar a nossa vida de quando em vez), para uma realidade abrupta, fria e seca! Que anula toda a doçura do mel anterior, do ouro vividos, onde nada! Mas nada, poderia correr mal e ISTO! Ver que afinal a vida é isto! De um minuto para o outro, tudo se transforma e acaba. Para nunca mais voltar! Portanto há que viver e apreciar. Dar graças por esses minutos que alguém se calhar já não contabiliza. Como sempre é um gosto! Uma inspiração lê-lo. Boa semana!


De m a 28 de Maio de 2012 às 05:52
"a fatalidade sempre à nossa espera entre desencontros, regressos e alcatrão."

:(

pois.


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