Estão todos consternados, de cara à banda, não ouço falar de mais nada. A tragédia, a notícia inesperada a alastrar pelos jornais, as fotografias-chave do percurso, uma carreira tão promissora, um fulgor na juventude, o mundo nas suas mãos, a adulação, o poder. E também as más fotografias, as histórias lamentáveis que saíram na imprensa, o declínio, o corpo inchado de anos e anos de drogas, os amigos em retirada veloz – tudo a surgir à tona outra vez. Há sempre uma história, quase banal que o mal não tem muita imaginação; uma série de más escolhas, uma coisa levou a outra, todos sabem o rosário, culpa da depressão que durou anos, o cair nas mãos dos outros, as veias entupidas de coca, o fígado a liquefazer, o coração a rebentar uma noite esmagado pelos excessos todos do passado. Todos a afirmarem que eram gigantes, e, afinal, a verdade é serem os mais francos do grupo, enjaulados na sua escuridão, uma fraqueza insuportável aos próprios, eis a raiz de tudo – os fortes caem sete vezes e levantam-se oito. Quantas vezes já vi isto? Perdi a conta, sempre o mesmo calvário a finar da pior maneira.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES