Chegaram há três dias e não voltaram a partir. Guardam os seus pertences debaixo de plásticos, vislumbram-se alguns móveis. A palavra despejo cavalgou o meu pensamento. São idosos e elegeram como morada o largo onde vivo. Vejo-os quando saio para beber café, ensonado pelas noites cada vez mais curtas; vejo-os quando regresso da labuta diária ao conforto; vejo-os quando percorro a rua em passo de corrida com os sacos das compras e chove copiosamente. Quando o céu se desfaz em torrentes permanecem de pé em silêncio de chapéus-de-chuva em riste. Invadem-me os sonhos à noite e de dia assemelham-se a um pesadelo. São a face visível da falência mais cruel, os despojos de vidas sem happy end.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES