Há um risco calculado em decidir conhecer fisicamente alguém que só conhecíamos virtualmente. Esse encontro pode ser fatal, podemos tropeçar numa paixão, podemos acabar ao estalo, é imprevisível. O que é previsível até à medula é que haveremos de nos enganar vezes sem conta. As amizades – como o amor – partem sempre de pressupostos nossos, não da realidade concreta. Não existindo manuais para lidar com tais situações, que nos ensinem a ver para além das aparências e nos salvem de nós próprios, estamos à mercê do vento. Alguém dizia-me que o ideal era termos forma de conhecermos alguém sem a conhecer mesmo, como escutas telefónicas à pessoa até formarmos uma opinião estável. Como qualquer tentativa de vigia causa-me urticária proponho métodos alternativos. Leitura integral e intensiva das cartas amorosas trocadas ao longo da vida e de toda a biblioteca com especial atenção nos sublinhados. Bisbilhotice ao cabaz de compras no mercado. Avaliação atenta aos animais de estimação, se não existirem tomar em atenção esse factor também. Uma dúzia de vídeos onde a pessoa fale extensamente de vários assuntos, de política à problemática do acasalamento. E depois disso tudo e de muita ponderação, talvez, um dia podemos combinar um blind date.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES