Ontem visitei o meu novo melhor amigo. Percebi pelo lápis estrategicamente encavalitado na orelha que a aculturação está a fazer das suas. Ainda assim o vacabulário continua reduzido o que satisfaz a minha necessidade de consolo. Como combinado estendeu-me a raquete em silêncio e pratiquei com veemência os meus melhores ataques no caixote das pêras. No fim devolvi-lhe a raquete e fiz-lhe gestos elegantes com os dois braços a rasar as orelhas, depois estendi-lhe os cinco dedos da mão direita e apontei com o indicador da mão esquerda para cada um deles. Despedimo-nos com uma pequena vénia demonstrativa do respeito mútuo que nos une. Este merceeiro ensinou-me com o seu tasco aberto até à meia-noite mais sobre marketing e estratégia de revitalização da baixa do que o Sá Fernandes e a Roseta juntos. Na rua o cão rafeiro ladrava sozinho ao vazio. Ao aperceber-me da sua solidão e loucura tive a certeza de ter tomado a decisão certa, a natação sincronizada é o meu novo desporto.
a minha língua é a pátria portuguesa
coisas extraordinárias do gabinete
grandes crimes sem consequência
pequenas ficções sem consequência
LEITURAS
Agora e na hora da nossa morte - Susana Moreira Marques
Caixa para pensar – Manuel Carmo
Night train to Lisbon – Pascal Mercier
CIDADES